lunes, 22 de junio de 2009

O trabalho científico, os públicos e o falso saber

O trabalho científico, os públicos e o falso saber

A construção dos objetos precisos da experiência e do conhecimento sendo presidida pelo procedimentos de dialetização [1] descarta a aplicação de qualquer “paradigma” ou modelo de análise exterior à explicação sociológica ou que pretenda substituir os procedimentos dialéticos tirados da realidade social ela mesma.

Deste ponto de vista, a marcha dos temas coletivos reais se desdobra no avanço da colocação em perspectiva sociológica do conhecimento, como um fato “transparente” cada vez mais acentuado ao longo dos séculos modernos e definitivamente assimilado na cultura do século XX.

Assim por exemplo, tornou-se extremamente difícil esperar que o público não profissional acolha a distinção metodológica entre (a) as proposições testáveis ou “formulações irrealistas” dos sociólogos científicos, feitas “no interesse da boa teoria científica” – como o postulado do comportamento que se conforma aos papéis sociais – por um lado e, por outro, (b) as afirmações de valor sobre a natureza do homem, que sejam atribuídas como decorrentes ou implícitas naquelas proposições teoréticas.

Ralf Dahrendorf reconhece que, por trás desta atribuição indevida de valor, tida por uma “espécie de reificação dos postulados”, observa-se que “o público geral não compreende a distinção sutil entre as afirmações entendidas realisticamente e os postulados deliberadamente irrealísticos de uma teoria (conjectural) científica". Estes últimos implicam uma divergência fundamental do mundo do senso comum que está no cerne da “contradição” entre esse “mundo do senso comum” e a ciência.

Esta, por sua vez, ao mesmo tempo em que acolhe a inadequação de um argumento puramente lógico, como ressalta aquele autor, – a “lógica da pesquisa científica sendo especificamente baseada na incerteza fundamental do conhecimento humano” – não é, entretanto possível sem a publicidade [2].

Desta forma, é inegável que esta situação de aparente contradição em face da incompreensão pelo público geral da “distinção sutil” de Dahrendorf acima destacada revela-se dialética.

Por esta via, nos colocam diante de duas orientações complementares, atinentes ao público da ciência como quadro social, configurando-se um caso de variação do saber, seguinte: (a) - se é o caráter profissional que se impõe ao público da ciência, há compreensão da distinção sutil entre as afirmações entendidas realisticamente e os postulados deliberadamente irrealísticos. E a classe do conhecimento científico, então, prevalece.

(b)- Se, pelo contrário, é o caráter não-profissional que se impõe há “não-compreensão”, e a classe do conhecimento do senso comum prevalece, com a atribuição de uma imagem sobre a “natureza do homem” sendo afirmada em um “falso saber”.

Desta forma vem a ser suscitada a sociologia do conhecimento, que exige a análise diferencial das classes de conhecimento. Quer dizer, a análise das sete classes do conhecimento mais profundamente implicadas (a)-na realidade social e (b) - na engrenagem de suas estruturas. A saber: 1) o conhecimento perceptivo do mundo exterior, que se nos apresenta como um domínio privilegiado, 2) o conhecimento de outro, dos Nós, dos agrupamentos particulares, das classes sociais e das sociedades; 3) o conhecimento de senso comum, 4) o conhecimento técnico, 5) o conhecimento político, 6) o conhecimento científico, 7) o conhecimento filosófico [3] .

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[1] Gurvitch, Georges (1894-1965): “Dialectique et Sociologie”, Flammarion, Paris 1962, 312 pp., Col. Science.

[2] Dahrendorf, Ralf: “Ensaios de Teoria da Sociedade”, Trad. Regina Morel, Revisão E Notas Evaristo de Moraes Filho, Zahar - Editora da Universidade de São Paulo (Edusp), Rio de Janeiro 1974, 335 pp. (1ªedição Em Inglês, Stanford, EUA, 1968). Cf. págs.114 a 117.

[3] Leia mais em Jacob (J.) Lumier: "Leitura da Teoria de Comunicação Social", Web da OEI, 2007,

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